segunda-feira, 31 de maio de 2010

Revelações do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica

Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica revela desmate de ao menos 20.867 hectares nos últimos dois anos. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e a Fundação SOS Mata Atlântica divulgaram em 26/05/2010, véspera do Dia Nacional da Mata Atlântica, dados parciais do “Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica” para o período de 2008-2010. Neste período, foram desmatados ao menos 20.867 hectares de cobertura florestal nativa, ou a metade do município de Curitiba, no Paraná. Para este resultado foram atualizados os mapas de 9 dos 17 Estados onde a Mata Atlântica ocorre: GO, ES, MG, MS, PR, RJ, RS, SC e SP; e a avaliação do período dos municípios destes nove Estados. Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina foram os que mais desmataram no período, sendo que os cinco municípios que mais perderam cobertura florestal nativa são de Minas Gerais. Os dados foram apresentados durante coletiva online promovida pela SOS Mata Atlântica, da qual participaram Marcia Hirota, diretora de Gestão do Conhecimento e coordenadora do Atlas pela SOS Mata Atlântica; Flávio Jorge Ponzoni, coordenador técnico do estudo pelo INPE; e Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação. Para a realização desta sexta edição do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, que considera o novo Mapa da Área da Aplicação da Lei 11.428 de 2006, publicada pelo IBGE (2008) e divulgada no começo de 2009, foram avaliados 94.912.769 hectares, ou 72% da área total do Bioma Mata Atlântica, nos estados de Goiás, Minas Gerais (avaliado em 80%), Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul (avaliado em 80%), Paraná (avaliado em 90%), Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os Estados do Nordeste ainda não puderam ser incluídos nesta atualização devido aos elevados índices de cobertura de nuvens e a previsão é que seus dados sejam divulgados até o final deste ano. Os dados levantados no período de 2008-2010, que totalizaram 94.912.769 hectares, mostram que entre os nove Estados analisados os que possuem desflorestamentos mais críticos são Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, que perderam 12.524 hectares, 2.699 hectares e 2.149 hectares, respectivamente. A estes números somam-se desflorestamentos de 1.897 hectares no Rio Grande do Sul, 743 hectares em São Paulo, 315 hectares no Rio de Janeiro, 161 em Goiás, 160 no Espírito Santo e 154 hectares no Mato Grosso do Sul, totalizando 20.867 hectares de floresta nativa suprimida. No que se refere ao desmatamento dos ecossistemas costeiros, dos nove Estados avaliados, São Paulo foi o único a perder 65 hectares de vegetação de restinga. Em Minas Gerais, a taxa de desmatamento anual aumentou em 15%: no último levantamento, a taxa anual de desflorestamento no Estado era de 10.909 hectares, e os dados de 2008-2010 apontam uma taxa de desmatamento de 12.524 hectares. Minas Gerais possuía originalmente 46% do seu território (ou 27.235.854 ha) cobertos pelo Bioma Mata Atlântica, e agora restam apenas 9,64% do Bioma, ou 2.624.626 hectares, no Estado. “Minas Gerais teve 80% de sua área avaliada, o que pode levar o número de desmatamento a ser ainda maior”, explica Flávio Ponzoni. No Paraná, apesar de o desflorestamento ainda continuar, a taxa anual de desmatamento diminuiu em 19%: de 3.326 hectares no período de 2005-2008, para 2.699 hectares no período de 2008-2010. O Paraná possuía 98% de seu território (ou 19.667.485 hectares) no Bioma Mata Atlântica, e agora possui 10,52% (2.068.985 hectares). 90% da Mata Atlântica nativa no Estado do Paraná foi avaliada. Santa Catarina diminuiu a taxa de desmatamento em 75%: de 8.651 hectares, o desflorestamento caiu para 2.149 hectares. Santa Catarina está inserido 100% no Bioma Mata Atlântica (9.591.012 hectares), e hoje restam apenas 23,37%, ou 2.241.209 hectares. Já o Rio Grande do Sul aumentou a taxa de desmatamento anual: desflorestou 83% a mais. A taxa, que era de 1.039 hectares/ano no período de 2005-2008, passou para 1.897 hectares. O Estado possuía 48% do seu território (ou 13.759.380 hectares) no Bioma, e hoje restam apenas 7,31% (1.006.247 hectares). Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo são áreas críticas para a Mata Atlântica, pois são os estados que mais possuem remanescentes florestais em seus territórios e acabam trazendo grandes desmatamentos em números absolutos. “No caso de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, é preciso que os governos federal e estaduais atuem firmemente, acompanhados sempre de perto pela sociedade, para diminuir e até zerar estes números pensando em políticas públicas para valorizar a floresta e que promovam o desenvolvimento de negócios que sejam aliados à conservação, como o turismo sustentável, assim como invistam em educação ambiental”, reforça Marcia. Confira aqui Desflorestamentos de Mata Atlântica ocorridos no período 2008-2010 Situação nos municípios Também foram apresentados dados do desmatamento da Mata Atlântica por municípios, nos nove Estados analisados no período de 2008-2010. Minas Gerais novamente lidera o desmatamento de cobertura nativa: os cinco municípios que mais desmataram são mineiros. Ponto dos Volantes e Jequitinhonha, ambos na região do Jequitinhonha, perderam 3.255 e 1.944 hectares, respectivamente. Águas Vermelhas, na região do Norte de Minas, perdeu 783 hectares. Em seguida, o município de Pedra Azul, também na região do Jequitinhonha, que desmatou 409 hectares, e São João do Paraíso, na região do Norte de Minas, que suprimiu 342 hectares. “Os desmatamentos nestes municípios e outros dessa região se concentraram nos limites do Cerrado e Caatinga, especialmente nas Matas Secas, para expansão da agropecuária e do carvão vegetal para siderurgia. É necessário que o uso do carvão vegetal seja regulamentado com florestas plantadas dentro dos critérios da certificação de produtos florestais, a exemplo do FSC”, afirma Mario Mantovani. O “Atlas dos Municípios da Mata Atlântica” revela a identificação, localização e situação dos principais remanescentes florestais existentes nos municípios abrangidos pela Mata Atlântica. Pelo IPMA (Índice de Preservação da Mata Atlântica), indicador criado pela SOS Mata Atlântica e o INPE, torna-se possível ranquear os municípios que mais possuem cobertura vegetal nativa. Os dados e mapas podem ser acessados pela internet, nos sites www.sosma.org.br e www.inpe.br ou diretamente no servidor de mapas http://mapas.sosma.org.br Mapa da Área da Aplicação da Lei no 11.428 de 2006 Desde sua quinta edição, de 2005-2008, o Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica considera a apropriação dos limites do Bioma Mata Atlântica tendo como base o Mapa da Área da Aplicação da Lei nº 11.428 de 2006. A utilização dos novos limites para os biomas brasileiros implicou na mudança da área total, da área de cada Estado, do total de municípios e a porcentagem de Mata Atlântica e de remanescentes em cada uma destas localidades. “Isso reforça o compromisso e o pioneirismo da SOS Mata Atlântica e do INPE em mostrar dados a partir do que diz a nova Lei e manter permanentemente atualizados”, comenta Ponzoni. A Mata Atlântica está distribuída ao longo da costa atlântica do país, atingindo áreas da Argentina e do Paraguai nas regiões sudeste e sul. De acordo com o Mapa da Área de Aplicação da Lei nº 11.428, de 2006 (IBGE, 2008), a Mata Atlântica abrangia originalmente 1.315.460 km² no território brasileiro. Seus limites originais contemplavam áreas em 17 Estados, (PI, CE, RN, PE, PB, SE, AL, BA, ES, MG, GO, RJ, MS, SP, PR, SC e RS). Nessa extensa área, vivem atualmente cerca de 61% da população brasileira, ou seja, com base no Censo Populacional 2007 do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, são mais de 112 milhões de habitantes em 3.222 municípios, que correspondem a 58% dos existentes no Brasil. Destes, 2.594 municípios possuem a totalidade dos seus territórios no bioma e mais 628 municípios estão parcialmente inclusos, conforme dados extraídos da malha municipal do IBGE (2005). A Mata Atlântica, complexo e exuberante conjunto de ecossistemas de grande importância, abriga parcela significativa da diversidade biológica do Brasil, reconhecida nacional e internacionalmente no meio científico. Lamentavelmente, é também um dos biomas mais ameaçados do mundo devido às constantes agressões ou ameaças de destruição dos habitats nas suas variadas tipologias e ecossistemas associados. O alto grau de interferência na Mata Atlântica é conhecido. Desde o descobrimento do Brasil pelos europeus, os impactos de diferentes ciclos de exploração, da concentração das maiores cidades e núcleos industriais e da alta densidade demográfica, entre outras atividades em sua área, fizeram com que a vegetação natural fosse reduzida drasticamente. Temos hoje apenas 7,9% de remanescentes em áreas acima de 100 hectares em comparação ao que havia originalmente. Este total desconsidera a área do Bioma Mata Atlântica do estado do Piauí, que até o momento não foi mapeado. Considerando todos os fragmentos de floresta acima de três hectares, temos 11,4% de cobertura florestal nativa. Confira aqui Remanescentes florestais da Mata Atlântica – ano base 2010 Histórico do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica A realização do “Atlas dos Remanescentes Florestais e Ecossistemas Associados do Bioma Mata Atlântica no período 1985-1990, 1990-1995, 1995-2000, 2000-2005, 2005-2008″, desenvolvido pela Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, órgão vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, representa um grande avanço na compreensão da situação em que se encontra a Mata Atlântica. O primeiro mapeamento, publicado em 1990 pela SOS Mata Atlântica e o INPE, com a participação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), teve o mérito de ser um trabalho inédito sobre a área original e a distribuição espacial dos remanescentes florestais da Mata Atlântica e tornou-se referência para pesquisa científica e para o movimento ambientalista. Foi desenvolvido em escala 1:1.000.000. Em 1991, a SOS Mata Atlântica e o INPE deram início a um mapeamento em escala 1:250.000, analisando a ação humana sobre os remanescentes florestais e nas vegetações de mangue e de restinga entre 1985 a 1990. Publicado em 1992/93, o trabalho avaliou a situação da Mata Atlântica nos dez Estados – Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que apresentavam a maior concentração de áreas preservadas. Os Estados do Nordeste não puderam ser avaliados pela dificuldade de obtenção de imagens de satélite sem cobertura de nuvens. Um novo lançamento ocorreu em 1998, desta vez cobrindo o período de 1990-1995, com a digitalização dos limites das fisionomias vegetais da Mata Atlântica e de algumas Unidades de Conservação federais e estaduais, elaborada em parceria com o Instituto Socioambiental. Entre o período de 1995-2000, fez-se uso de imagens TM/Landsat 5 ou ETM+/Landsat 7 em formato digital analisadas diretamente em tela de computador, permitindo a ampliação da escala de mapeamento para 1:50.000 e conseqüentemente a redução da área mínima mapeada para 10 hectares. No levantamento anterior, foram avaliadas as áreas acima de 25 hectares. Os resultados revelaram novamente a situação da Mata Atlântica em 10 dos 17 Estados – a totalidade das áreas do bioma Mata Atlântica de Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e áreas parciais da Bahia – que abrangeram nesta etapa 1.185.000 km2, ou seja, 94% da área total do Bioma Mata Atlântica. Em 2004, a SOS Mata Atlântica e o INPE lançaram o “Atlas dos Municípios da Mata Atlântica”, de forma a fornecer instrumentos para o conhecimento, o monitoramento e o controle para atuação local. A partir da identificação e da localização dos principais remanescentes florestais existentes nos municípios abrangidos pela Mata Atlântica, cada cidadão, diferentes setores e instituições públicas e privadas puderam ter fácil acesso aos mapas por meio da internet e se envolver e atuar em favor da proteção e conservação deste conjunto de ecossistemas. O desenvolvimento da ferramenta de publicação dos mapas na internet foi realizado pela ArcPlan, utilizando tecnologia do MapServer (Universidade de Minnesota), com acesso nos portais www.sosma.org.br e www.dsr.inpe.br Ao final de 2004, as duas organizações iniciaram a atualização dos dados para o período de 2000 a 2005. Esta edição também foi marcada por aprimoramentos metodológicos e novamente foram revistos os critérios de mapeamento, dentre os quais se destaca a adoção do aplicativo ArcGis 9.0, que permitiu a visualização rápida e simplificada do território de cada Estado contido no Bioma Mata Atlântica. Isso facilitou e deu maior segurança nos trabalhos de revisão e de articulação da interpretação entre os limites das cartas topográficas. A quarta edição do “Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica” apresentou dados atualizados em 13 Estados abrangidos pelo bioma (PE, AL, SE, BA, GO, MS, MG, ES, RJ, SP, PR, SC, RS). Um relatório mostrou a metodologia e os resultados quantitativos da situação dos remanescentes da Mata Atlântica desses Estados e os desflorestamentos ocorridos no período de 2000-2005 em 10 Estados, da Bahia ao Rio Grande do Sul. Esta fase manteve a escala 1:50.000, e passou a identificar áreas acima de três hectares e o relatório técnico, bem como as estatísticas e os mapas, imagens, fotos de campo, arquivos em formato vetorial e dados dos remanescentes florestais, por Município, Estado, Unidade de Conservação, Bacia Hidrográfica e Corredor de Biodiversidade. Em 2008, foram divulgados os números atualizados a partir de análises da 4ª edição do Atlas, incluindo os Estados de Bahia, Minas Gerais, Alagoas, Pernambuco e Sergipe, que, somados ao mapeamento dos Estados de Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará gerados pela ONG Sociedade Nordestina de Ecologia, totalizam 16 dos 17 Estados onde o Bioma ocorre, ou 98% de Mata Atlântica. Em 2009, a 5ª edição do Atlas trouxe os números do desmatamento com dados atualizados, até maio de 2009, em 10 Estados abrangidos pelo bioma (BA, GO, MS, MG, ES, RJ, SP, PR, SC, RS). Esta edição apresentou a metodologia e os resultados quantitativos da situação dos remanescentes da Mata Atlântica desses Estados e os desflorestamentos ocorridos no período de 2005-2008, que representam 93% do Bioma Mata Atlântica. Esta fase manteve a escala 1:50.000, passou a identificar áreas acima de três hectares sobre as imagens dos sensores CCD do satélite sino-brasileiro CBERS-2 (CCD/CBERS-2) e TM/Landsat 5 do ano de 2005 e a atualização incluiu a utilização de imagens TM/Landsat 5 de 2008. Em 2010, a sexta edição do “Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica” traz dados atualizados, até maio de 2010, de nove Estados abrangidos pelo Bioma (GO, MS, MG, ES, RJ, SP, PR, SC, RS). O documento apresenta, sinteticamente, a metodologia atual, os mapas e as estatísticas globais e por estado. O mapeamento utiliza imagens do satélite Landsat 5 que leva a bordo o sensor Thematic Mapper. Os trabalhos envolvem ainda outros esforços de todos que atuam em defesa da Mata Atlântica, especialmente aqueles com foco nos programas para políticas de conservação: no ano de 2005, deu-se início ao projeto “De olho na Mata”, cuja área-piloto foi a região do litoral norte do Estado de São Paulo e sul-fluminense, de forma a mapear a dinâmica do uso da terra e analisar o impacto que a urbanização descontrolada causa no ambiente e na qualidade de vida da população. Este projeto conta com o patrocínio da empresa Klabin; o Atlas dos Municípios da Mata Atlântica foi lançado em 2005 e revelou a situação da Mata Atlântica de 2000 em 2.815 cidades de 10 dos 17 Estados que são abrangidos pelo bioma (Bahia, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), e mostra os índices de representatividade da vegetação de mangue e restinga. O Atlas apresenta ainda o IPMA (Índice de Preservação da Mata Atlântica) – indicador criado pela SOS Mata Atlântica e o INPE – com o ranking dos municípios que possui a vegetação nativa da Mata Atlântica. Até então, os dados eram divulgados somente por Estado. “Este Atlas tem se apropriado do desenvolvimento tecnológico na área da informação, do geoprocessamento e do sensoriamento remoto. Em cada edição, vários aprimoramentos foram implementados e alguns estudos qualitativos estão sendo realizados, de forma a subsidiar as pesquisas e contribuir cada vez mais ao conhecimento sobre o Bioma”, afirma Flavio Ponzoni, coordenador do Atlas pelo INPE. Em 2008, foi divulgada a situação do desmatamento para o período de 2005-2007 nos 51 municípios que mais devastaram no período de 2000-2005, e em 2009, a situação no período de 2005-2008 para dez Estados e seus municípios. Para o monitoramento e análise da situação da Mata Atlântica desde 1989, foram investidos recursos na ordem de R$ 6 milhões, provenientes da iniciativa privada. Esta fase conta com patrocínio do Bradesco Cartões. A execução técnica é da Arcplan. (EcoDebate)

sábado, 29 de maio de 2010

Resíduo eletrônico: O que fazer?

Seu computador estraga ou você decide comprar um novo celular. O que você faz com o equipamento antigo? Segundo o professor de Engenharia de Materiais da UFGRS, Hugo Veit, os brasileiros produzem cerca de 300 mil toneladas de resíduo eletrônico anualmente. Infelizmente, o país ainda não tem locais apropriados para descarte desses equipamentos. Em entrevista, por telefone, à IHU On-Line, Veit alerta para os riscos ambientais que os resíduos eletrônicos podem trazer. “A composição química desses resíduos é muito variada. Se esses metais forem descartados de forma incorreta na natureza, eles vão contaminar o solo, o lençol freático, a água, e, de uma forma ou de outra, isso volta para nós”, destaca. Para o professor, uma das formas para evitar a grande produção deste tipo de lixo é frear o consumismo, uma tarefa nada fácil. “É difícil desmaterializarmos. Temos a vontade de sempre acompanhar a tecnologia, com equipamentos mais novos”, defende. Hugo Veit possui graduação em Engenharia Metalúrgica, mestrado e doutorado em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é professor da Escola de Engenharia/Departamento de Materiais e pesquisador do Laboratório de Corrosão, Proteção e Reciclagem de Materiais (LACOR).
Confira a entrevista. IHU On-Line – O que pode ser considerado resíduo eletrônico? Hugo Veit – Todo o tipo de equipamento como mp3, mp4, computador e celular. Esses aparelhos são considerados eletro-eletrônicos, assim como suas pilhas e baterias. Tudo isso é lixo eletro- eletrônico. O que acontece hoje é que a linha branca, que contempla geladeiras, fogões, máquinas de lavar roupas etc., que antigamente não se enquadravam como lixo eletrônico, começa a fazer parte deste grupo, já que têm em seu sistema cada vez mais eletrônicos embarcados. IHU On-Line – Onde vão parar os resíduos eletrônicos e qual é o lugar certo? Hugo Veit – Existem vários destinos para esse lixo. No campo doméstico, não há onde depositá-los, então, muita gente ainda descarta celulares, televisores e computadores velhos junto ao lixo seco. Atualmente, as grandes empresas ou órgãos públicos fazem parcerias, principalmente com ONGs, para remanufatura ou reciclagem. Eles recebem equipamentos defeituosos ou obsoletos, como processadores, por exemplo, e utilizam as peças para remontar produtos que estejam em condição de uso. Depois, esses aparelhos geralmente são doados para centros de inclusão digital. Os consumidores domésticos que possuem lixo eletrônico em casa devem levá-lo a esses órgãos sociais, não existe alternativa. Não existem pontos de coleta para esse tipo de resíduo, com exceção de pilhas e baterias. Como o volume é menor, encontramos depósitos para esse tipo de produto em bancos e universidades, por exemplo. As operadoras de celulares também disponibilizam urnas de coleta para celulares obsoletos. O ideal seria levar esse material para indústrias de reciclagem, mas como elas não existem de forma esquematizada no Brasil, o essencial é não misturar o lixo eletrônico com o lixo orgânico ou seco. Caso não haja uma urna de coleta próxima, é interessante procurar entidades sociais que aceitam doações de equipamentos estragados. IHU On-Line – Que tipo de problemas ambientais os resíduos eletrônicos podem trazer? Hugo Veit – Vários tipos, pois a composição química desses resíduos é muito variada. Em sua fabricação, são utilizados muitos tipos de metais, e alguns deles são tóxicos. Há chumbo, mercúrio e cádmio, por exemplo. Se esses metais forem descartados de forma incorreta na natureza, eles vão contaminar o solo, o lençol freático, a água, e, de uma forma ou de outra, isso volta para nós. Há outros tipos de compostos químicos que se misturam ao plástico da carcaça do aparelho, que são à base de bromo. Esses compostos são utilizados como retardadores de chama. É uma questão de segurança, mas, no momento da reciclagem, esses compostos, em contato com a natureza, serão prejudiciais à saúde humana. Eles atacam o sistema nervoso, endócrino e respiratório. IHU On-Line – Qual é o volume brasileiro de lixo eletrônico? Hugo Veit – Não temos uma estatística muito confiável de quanto resíduo é gerado. O que se tem são dados de vendas de equipamentos. No ano passado, foram vendidos cerca de 40 milhões de celulares e 12 milhões de computadores no Brasil. Cada aparelho tem uma vida útil específica, no caso do celular, é de mais ou menos um ano e meio. No final desse tempo, milhões de aparelhos vão para o lixo. No caso dos computadores, a vida útil é de cerca de três anos. “Se somarmos todos os produtos, produzimos cerca de 300 mil toneladas por ano de resíduo eletrônico”
Indústria utilizando a pirometalurgia A estatística em torno da quantidade de resíduos ainda é insuficiente. O que se tem é um relatório da ONU. No ano passado, foi publicado um relatório com dados de 2005. No trabalho de pesquisa da organização, chegou-se a valores de meio quilo de resíduos de computador por habitante, anualmente, no Brasil. Se pensarmos nisso, levando em conta que temos cerca de 190 milhões de habitantes, teremos 95 milhões de quilos de resíduos só de computadores. No caso dos televisores, são 0,6 quilos por habitantes. Se somarmos todos os produtos, produzimos cerca de 300 mil toneladas por ano de resíduo eletrônico. IHU On-Line – O senhor pode nos explicar quais são as rotas que podem ser usadas para reciclagem? Hugo Veit – Há dois tipos de reciclagem: a de metal e a de plásticos. Na parte de metais, temos, basicamente, quatro rotas possíveis, todas baseadas em processos metalúrgicos, de fabricação de metais a partir da natureza. Existe a pirometalurgia, cuja ideia é baseada em processos térmicos com a fundição do resíduo. Quando imaginamos um resíduo eletrônico dentro de um forno, por exemplo, a ideia é queimá-lo. A parte plástica irá evaporar e a parte metálica vai virar uma liga metálica. É a partir dessa liga que se separa o cobre do ferro, do alumínio etc. O problema dessa rota é que, como estamos queimando o lixo, e a parte plástica é tóxica, devemos ter um bom sistema de escapamento. Porém, processos térmicos têm um grande consumo energético, já que exigem altas temperaturas. Outra rota é a hidrometalurgia. A ideia é lavar o resíduo para dissolver a parte metálica e levar os metais para uma solução iônica. Assim, podemos separá-los entre si. A terceira rota é o processamento mecânico, onde se utiliza a diferença de propriedades físicas. Sabemos que alguns metais são mais pesados, magnéticos ou condutores. A quarta rota para reciclar metais é eletrometalurgia, que, ao invés de conservar os metais na forma sólida, os dissolvem em uma solução iônica, onde podemos reduzi-los a uma célula para que os metais possam ser separados.
Na parte dos plásticos, temos algumas alternativas com três rotas principais: a reciclagem mecânica, química e energética. A reciclagem energética é baseada na ideia de que o plástico é originado do petróleo, e que, em princípio, ele é um combustível que pode ser queimado para a geração de energia. Claro que não é uma queima a céu aberto, é uma queima controlada. A reciclagem química tem a ideia de pegar o plástico dos equipamentos e transformá-los novamente em um produto petroquímico, como se estivéssemos partindo do petróleo e usando-o para fazer plástico. Por fim, a reciclagem mecânica é a mais utilizada. Consiste em quebrar o plástico, pegar um tipo de polímero, cuidando para separar os plásticos por tipos, triturá-lo, e, com esse material moído, fazer uma peça plástica. Isso pode ser feito com 100% de material reciclado ou com um percentual de material novo. IHU On-Line – O setor informal pode reciclar também esses resíduos? Hugo Veit – Isso é muito complicado. A grande dificuldade da reciclagem de eletro- eletrônicos é a complexidade. Não é uma reciclagem simples e manual. Associações de catadores, por exemplo, não terão equipamentos mais sofisticados para separar esses materiais. É diferente de pegar lixo seco e fazer a separação dos componentes. A reciclagem de eletrônicos envolve processos industriais mais elaborados, com várias etapas. IHU On-Line – De que forma a sociedade mundial precisa avançar para a desmaterialização? Hugo Veit – É difícil desmaterializarmos. Temos a vontade de sempre acompanhar a tecnologia, com equipamentos mais novos, mais modernos, com mais recursos. Isso se dá também pela vida útil muito curta dos aparelhos. Porém, muitas vezes, trocamos de celular, por exemplo, não porque ele estragou, mas porque queremos um novo. Esta é uma questão de educação ambiental. “Muitas vezes, trocamos de celular, por exemplo, não porque ele estragou, mas porque queremos um novo” A educação de casa, do colégio, deve fazer com que o consumismo não seja tão importante em nossas vidas. O Brasil, principalmente, tem muito que evoluir. Existem outros países onde o consumismo não é tão grande, e mesmo que seja, alguns possuem uma boa educação ambiental e conseguem separar bem o lixo. Quanto mais segregado for o resíduo que geramos, mais viável será o processo de reciclagem. No Brasil, falta muito para uma evolução. Não temos legislação para o lixo eletrônico, então de quem é a responsabilidade? Não existe uma corresponsabilidade. Temos muito que crescer em termos de reciclagem, coleta, educação e conscientização no Brasil. (Ecodebate)

quinta-feira, 27 de maio de 2010

O lixo nosso de cada dia

O lixo nosso de cada dia: Pesquisadora pesa e analisa resíduos produzidos em uma semana por quatro famílias paulistanas.
Hábitos. “As pessoas têm rotinas corridas e preferem consumir alimentos prontos”, diz pesquisadora. O material de trabalho da geóloga Ivone Silva, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), é o que o resto das pessoas descarta. Munida de avental, luvas de borracha e uma balança de supermercado, ela gosta de sair a campo para analisar o lixo produzido nas cidades. Entre 2008 e 2009, Ivone separou e pesou 250 quilos de resíduos por dia. Contou apenas com o apoio de dois bolsistas e de dois funcionários da prefeitura para fazer um raio X do lixo em Diadema, no ABC. A pedido do Estado, Ivone e os universitários Carolina Theóphilo e Paul Fooster repetiram a experiência num universo muito menor. Analisaram o lixo inorgânico produzido durante uma semana em quatro apartamentos, com dois a cinco moradores, de um prédio na região da Consolação, em São Paulo. O resíduo orgânico, que no País responde por cerca de 50% do lixo doméstico, foi descartado para facilitar a estocagem. O objetivo da iniciativa foi mostrar às pessoas o quanto elas produzem de resíduos. “Nunca tinha parado para refletir sobre isso”, diz Márcia Marino, de 50 anos. Márcia, o marido e os filhos, adultos jovens, foram os campeões na produção de lixo, com 3,58 quilos – total que inclui 20 garrafas PET de refrigerante. Ou seja, em um ano a família produziria pouco mais de 170 quilos – ou o dobro disso, considerando o lixo orgânico. “Vou tentar produtos com embalagens diferentes, como vidro. Aqui em casa a gente manda para reciclagem, então esse lixo não está sendo jogado no ambiente.” Ivone também analisou os itens que mais pesaram no volume de lixo produzido pelas famílias. Os vilões foram o papelão e o plástico duro ou PET. “São itens geralmente mais pesados”, explica. A professora da Unifesp lembra que há diferenças gritantes de consumo em áreas pobres ou ricas, mas vê uma tendência clara da população em favor de alimentos prontos, embalados, em porções cada vez menores. “As pessoas têm rotinas corridas e preferem comprar o alho já picado, molho de tomate pronto. Até a água de coco vem em embalagem longa-vida”, afirma Ivone. “As embalagens representam um avanço tecnológico para conservar alimentos, mas depois o consumidor não sabe o que fazer com elas.” A experiência teve um adendo: analisar os resíduos secos produzidos pelos serviços de delivery de fast food. Os moradores de um dos apartamentos, pai, mãe, filho de 10 anos e empregada doméstica, concordaram em pedir durante quatro noites refeições das redes Habib”s, China in Box, Mc Donald”s e Pizza Hut. Os resíduos foram pesados e separados por material. “O pedido de pizza fica em primeiro lugar, porque o papelão pesa mais, mas o lixo dos outros pedidos também foi relevante pelo grande número de unidades de embalagens”, analisou Ivone. A Pizza Hut afirmou que as embalagens do delivery são recicláveis. “Nos últimos dois anos, a empresa investiu em novas tecnologias. Reduzimos em mais de 20% o material utilizado.” O McDonald”s liderou em volume e em número de embalagens. A empresa afirma que tem um compromisso com o ambiente e adota condutas como o princípio dos três R”s: reduzir, reutilizar e reciclar. “Essa política norteia a logística de distribuição e a operação dos restaurantes.” O Habib”s alegou que suas embalagens incentivam o cliente a reciclar. “Além disso, a rede sempre procura definir embalagens de materiais recicláveis, reduzindo sua variedade e tamanho.” O China in Box afirmou que a embalagem de seu box padrão usa papel cartão certificado. “A empresa também está prestes a implantar o uso de sacolas biodegradáveis, possivelmente ainda no segundo semestre de 2010.” PODER AQUISITIVO Em países ricos, a concentração de resíduos inorgânicos é maior do que a de orgânicos, pelo maior consumo de alimento embalado Lixo per capita 1 kg de lixo por habitante por dia é a média do brasileiro. Entre os americanos, esse volume é de 2,25 kg. Em São Paulo, é de 1,5 kg São Paulo 10% do lixo produzido por dia no Brasil é gerado na capital paulistana, o equivalente a 17 mil toneladas diárias de resíduos (EcoDebate)

Entulho da construção civil

Os resíduos de construção civil ou demolição (resíduo de C&D) ou simplesmente denominado entulho, tem uma composição muito heterogênea e varia muito conforme a região em função das alterações das técnicas construtivas.
A constituição dos entulhos é argamassa, areia, cerâmica, concreto, madeira, metais, papéis, plásticos, pedras, tijolo e tintas. O concreto é o segundo material mais utilizado pela humanidade, logo depois da água.
O entulho da construção civil sempre foi considerado inerte. Inerte é todo material que mantido durante 24h em água bi-destilada não altera as propriedades físico químicas da água. Mas é claro que não é todo resíduo de construção civil que é inerte. Gesso dissolve em água. Tinta contém metais pesados em sua composição, que se solubilizam na água. As telhas de fibro cimento antigamente continham amianto que no ar é altamente cancerígeno.
Os índices de perda de matérias-primas na construção civil é bastante elevado. Muitos autores divergem sobre as quantidades mas o certo é que são quantidades elevadas. (AGOPYAN, V. et al. Alternativas para a redução do desperdício de materiais nos canteiros de obras. São Paulo, 1998 (Relatório final: vol. 1 ao 5); SOIBELMAN, L. As perdas de materiais na construção de edificações: sua incidência e seu controle. Porto Alegre: Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado), 1993. 127 p.).
Este fato tem duas conseqüências imediatas e inevitáveis: o setor repassa sua ineficiência para os preços dos imóveis, que nós pagamos. O setor produz um impacto ambiental desnecessário ao utilizar matérias-primas naturais em quantidade superior ao necessário, registrando uma contabilidade sócio ambiental negativa.
Devemos ressaltar que o setor de construção civil é um dos maiores empregadores de mão de obra não qualificada, e que este é o preço que acaba tendo que pagar por este fato.
Atualmente são aceitos índices de desperdício no consumo de matérias primas que oscilam desde 8% em empresas com alto padrão de desempenho gerencial, até cerca de 20 ou 30% nas obras em geral. Neste último caso, podemos afirmar que para cada 3 edifícios, sobraria material para construir um quarto, caso o material fosse bem gerenciado em “lay outs” de obra adequados.
As obras de reforma, pela falta de uma cultura de reutilização e reciclagem, geram muitos entulhos. Em todas as cidades a geração de entulho se equivale a quantidade de geração de resíduos sólidos urbanos domésticos. E quando as cidades são submetidas a grandes intervenções urbanas, como novas avenidas, túneis ou obras de saneamento, geralmente a proporção de geração de entulhos fica muito maior.
O pequeno construtor e o chamado “construtor formiga”, em todo Brasil, continuam jogando estes materiais em estradas, avenidas, terrenos baldios, rios e córregos. O surgimento dos caçambeiros contribuiu para que este quadro fosse amenizado, com a criação de locais para depósitos, mas estes locais nem sempre são adequados e esta não é a melhor solução.
Algumas prefeituras como a de Belo Horizonte, Ribeirão Preto e Curitiba tem implantado usinas de reciclagem de entulho. Em Belo Horizonte existe uma rede de pontos de coleta de recebimento de pequenos volumes que em geral são transportados por carroceiros autorizados, e duas usinas de reciclagem, uma no bairro Estoril e outra na Pampulha.
Nestas usinas o entulho é beneficiado produzindo agregados que são reutilizados como sub-leito de pavimentos ou no processamento de artefatos de concreto para a própria construção civil.
Dados de São Paulo estimam em 372.000 toneladas a produção mensal de entulho (ZORDAN, S. E. A Utilização do Entulho como Agregado na Confecção do Concreto. Campinas: Departamento de Saneamento e Meio Ambiente da Faculdade de Engenharia Civil, Universidade Estadual de Campinas. Dissertação (Mestrado), 1997). Em Cuiabá não existem dados publicados, mas é possível estimar em 15 a 20.000 toneladas mês de entulhos da construção civil. (EcoDebate)

Reciclar o entulho da construção civil

Entulho da construção civil
Reciclagem é a expressão que melhor sintetiza a mudança de atitude exigida pelos novos paradigmas ou padrões de relacionamento do homem com os meios naturais (físico e biológico).
A reciclagem do entulho da construção civil tem vantagens econômicas, sociais e ambientais. Permite economia na aquisição de matéria prima, pela substituição dos materiais naturais pelo entulho beneficiado. Produz diminuição da degradação ambiental gerada pelo acúmulo de entulho em locais inadequados, responsável por assoreamentos e enchentes em cursos de água superficiais. Permite a preservação das reservas naturais de matéria prima.
A reciclagem de argamassas, concretos, cerâmicas, tijolos e assemelhados pode ser reutilizada em pavimentação (BODI, J. Experiência Brasileira com Entulho Reciclado na Pavimentação. In: Reciclagem na Construção Civil, Alternativa Econômica para Proteção Ambiental, 1997, São Paulo. Anais… São Paulo: PCC – USP, Departamento de Engenharia de Construção Civil, 1997. 76 p. p. 56-59).
Pode também ser utilizada em agregados para concreto, quando diminui a quantidade de cimento, quando o material deve estar isento de faces polidas em materiais cerâmicos (pisos e azulejos) que interferem reduzindo a resistência a compressão dos concretos.
Embora pesquisas tenham demonstrado eficácia do processo, vários fatores como os relacionados à durabilidade do concreto produzido ainda precisam ser analisados (HANSEN, T.C. RILEM Report No 6, E&FN Spon, 1992; RILEM TC 121 – DRG. Specification for concrete with recicled aggregates. Materials and Structures, v. 27, p. 557-559, 1994; CONSTRUÇÃO Para não virar pó. São Paulo: Pini, n. 2348, p. 10, fev. 1993). As prefeituras de São Paulo e a de Ribeirão Preto já utilizam blocos de concreto feitos com entulho reciclado.
O entulho pode ser processado também por equipamentos chamados “argamasseiras” que moem o entulho na própria obra em granulometria semelhante a da areia, permitindo o uso em argamassas de assentamento e revestimento (LEVY, S. M., HELENE, P. R. L. Reciclagem do entulho de construção civil, para utilização como agregado de argamassas e concretos. São Paulo: Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Dissertação de mestrado. 1997 146 p; HAMASSAKI, L. T, SBRIGHI NETO, C., FLORINDO, M. Uso do entulho como agregado para argamassas de alvenaria. In: Seminário sobre reciclagem e reutilização de resíduos como materiais de construção, 1996, São Paulo. Anais… São Paulo: PCC – USP, Departamento de Engenharia de Construção Civil, 1996. 161 p. p. 109-117).
O processamento dos entulhos de construção civil poderá ainda ser utilizado em concreto reciclado como agregado, no encascalhamento de estradas, no preenchimento de vazios em construções, no preenchimento de valas de instalações e no reforço de taludes em aterros.
A indústria da construção civil tem passado pela implantação de amplos programas de qualidade, onde as empresas atuam fortemente para suprir as deficiências de formação de seus recursos humanos e propiciam treinamentos específicos em larga escala. E muitas vezes possibilitam a participação dos colaboradores nos resultados dos programas de qualidade e gestão de resíduos sólidos (NAIME, R.; LERNER, L.. Gestão de resíduos sólidos na Construtora Melnick – Porto Alegre – RS. Gestão e Desenvolvimento (Novo Hamburgo), v. 4, p. 77-83, 2007).
Este fato induzirá a grandes melhorias num futuro próximo. Mas é necessário a participação do poder público como indutor e parceiro destas melhorias, como já praticam as prefeituras de São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Ribeirão Preto. (EcoDebate)

Coleta seletiva não acompanha ritmo

Os programas de coleta seletiva dos municípios brasileiros não acompanham o ritmo da produção de lixo no País. Embora a geração de resíduos tenha crescido 7,7% entre 2008 e 2009, o número de municípios com iniciativas de coleta seletiva avançou apenas 1,2% no período. Em 2008, 55,9% das cidades brasileiras tinham programas; em 2009, eram 56,6%.
As atividades de coleta seletiva de materiais recicláveis parecem ter chegado a um ponto de indefinição. Pouco mais da metade dos municípios tem iniciativas nesse sentido ou estimulam tais atividades, mas esse índice não avança na mesma medida que a geração de resíduos", diz Carlos Roberto Silva Filho, diretor executivo da Abrelpe, entidade que reúne empresas de coleta de lixo. Segundo ele, projetos voluntários são apenas uma solução parcial para o problema.
Silva observa, no entanto, que a geração de lixo é menor justamente nas capitais que possuem programas bem-estruturados de coleta seletiva, como Porto Alegre, que está abaixo da média nacional na produção diária de resíduos por habitante.
Enquanto o brasileiro na média produz 1,152 kg por dia, o porto-alegrense gera 1,073. Curitiba, que também tem coleta seletiva eficiente, produz 1,195 kg por habitante/dia, média ligeiramente superior à nacional. "Ao separar os resíduos, o cidadão presta atenção no lixo que produz. E esse é o primeiro passo para reduzir", afirma.
Reciclagem. Apesar da estagnação no número de municípios que praticam a separação dos resíduos, o Brasil manteve posições avançadas na reciclagem de alguns tipos de materiais, como latas de alumínio (91,5% de reciclagem, o mais alto índice do mundo), plástico PET (54,8%, só perdendo para o Japão), vidro (47%) e papel (45%).
Na avaliação de André Vilhena, diretor executivo do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), entidade que apoia cooperativas de catadores e programas de reciclagem nas empresas, o Brasil avançou de forma significativa nos índices de reciclagem de materiais. "São altos quando comparados a outros países. Isso mostra que estamos no caminho certo", diz Vilhena.
Segundo ele, a aprovação da lei nacional de resíduos sólidos deve fortalecer a cadeia da reciclagem, ao propor um marco regulatório para que prefeituras, empresas e consumidores tenham responsabilidades compartilhadas na gestão do lixo. "Para avançar ainda mais, precisamos fortalecer o papel dos catadores com maior investimento das prefeituras e empresas na organização de cooperativas, ampliando a eficiência e melhorando aspectos de qualidade e segurança do trabalho. A lei nacional vai ajudar muito neste aspecto."
Para Fernando Von Zuben, diretor de meio ambiente da fabricante de embalagens Tetra Pak, as indústrias que usam resíduos como matéria-prima já enfrentam dificuldades. "A coleta não atende a demanda das fábricas. Está faltando de PET a embalagens cartonadas." (estadão.com.br)

Brasileiro produz tanto lixo quanto europeu

Estudo em 364 cidades mostra que o País já se aproxima dos Estados Unidos, o campeão.
O brasileiro já produz a mesma quantidade de lixo que um europeu. A melhoria do poder de compra dos brasileiros está fazendo com que a população do País produza cada vez mais lixo inorgânico, como embalagens, ao mesmo tempo em que a implantação de programas de coleta seletiva e os níveis de reciclagem não crescem na mesma medida. Os dados fazem parte do estudo Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2009, que será divulgado hoje, no Rio de Janeiro.
A média de geração de lixo no Brasil hoje é de 1,152 quilo por habitante ao dia, padrão próximo aos dos países da União Europeia (UE), cuja média é de 1,2 kg ao dia por habitante. Nas grandes capitais, esse volume cresce ainda mais: Brasília é a campeã, com 1,698 kg de resíduos coletados por dia, seguida do Rio, com 1,617 kg/dia, e São Paulo, com 1,259 kg/dia. Além disso, o volume de lixo cresceu 7,7% em 2009 - foram 182 mil toneladas/dia produzidas ante 169 mil toneladas/dia no ano anterior.
O estudo, anual, abrange 364 municípios e foi realizado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), entidade que reúne as empresas de coleta e destinação de resíduos. "Alcançamos um padrão europeu de geração de resíduos e estamos nos aproximando dos americanos (2,8 kg por habitante/dia). Infelizmente, isso está acontecendo sem alcançarmos o mesmo grau de desenvolvimento desses países", afirma Carlos Roberto da Silva Filho, diretor executivo da Abrelpe.
Segundo ele, a produção de lixo em capitais como Brasília caminha para se tornar próxima aos 2,8 Kg por habitante/dia, que é em média de um cidadão americano. “Isso revela muito sobre o hábito de consumo e descarte dos moradores dessas cidades. Quanto mais alta a renda, maior o consumo de comida pronta, por exemplo, que implica em excesso de embalagens”, afirma.
De acordo com o levantamento, 56,8% desse lixo vai para aterros sanitários, 23,9% vai para aterros controlados (que não possuem tratamento de chorume) e 19,3% termina em lixões. Os aterros das grandes cidades, no entanto, caminham para a saturação. “Os resíduos gerados na cidade de São Paulo hoje são enviados para aterros a 30 km de distância”, diz Silva.
Entulho
Não são apenas os resíduos que caracterizam o lixo doméstico (restos de alimentos, embalagens) que estão em expansão. O País também está produzindo mais entulho de construção: hoje, na média, cada brasileiro produz 0,576 kg de resíduos de construção civil. Em 2009, foram 91,4 mil toneladas/dia do entulho, um crescimento de quase 14% em relação a 2008, quando foram geradas 80,3 mil toneladas por dias de entulho.
Segundo Silva, isso é reflexo do bom momento da economia e do setor de construção em especial. “Há mais pessoas construindo e nenhuma lei que regulamente o descarte desses materiais.”
Lei Nacional
Uma das saídas para o problema do aumento do lixo é a lei nacional de resíduos sólidos. O projeto foi aprovado na Câmara em março/10, após 19 anos de idas e vindas, e agora aguarda a votação do Senado.
Várias entidades, incluindo representantes da indústria e de ONGs, fazem pressão para que a lei saia até 5 de junho de 2010, Dia Mundial do Meio Ambiente. “A expectativa é que a lei já seja sancionada pelo presidente Lula na data”, diz Fernando Von Zuben, diretor de meio ambiente da indústria de embalagens Tetra Pak e um dos articuladores do grupo de trabalho sobre o tema.
Faça a sua parte
Evite a compra de alimentos para não haver desperdício. Dimensione a compra de produtos perecíveis com as necessidades da família.
Reduza embalagens
Evite comprar frutas, verduras e legumes embalados. Dê preferência para produtos vendidos a granel: leve a embalagem de casa. Escolha produtos com o menor número de embalagens. Opte por produtos com refil e reduza o uso de sacolas plásticas.
Coleta de lixo per capita – média em kg
A produção e a coleta no País/habitante/dia
Estados Unidos – 2,8
Brasil – 1,252
Europa – 1,2
A produção e a coleta em algumas capitais brasileiras/habitante/dia
Brasília – 1,698
Rio de Janeiro – 1,617
Salvador – 1,44
São Paulo – 1,259
Curitiba – 1,195
Porto Alegre – 1,073
Mais municípios têm acesso a serviços de coleta seletiva (em porcentagem)
2007: 83,3%
2008: 87,94%
2009: 88,15%
Geração de lixo (em toneladas/dia)
2008: 169.658
2009: 182.728
Houve uma variação de 7,7%
Quanto é reciclado (em porcentagem)
Alumínio (latas): 91,5
Plástico PET: 54,8
Vidro: 47
Papel: 45
Alumínio (total): 35,3
Plástico (total): 19,4 (OESP)

terça-feira, 25 de maio de 2010

‘Casa Alemã’

Modelo alemão de casa ecoeficiente roda a América Latina

‘Casa Alemã’ no Ibirapuera: inspiração para outros projetos
A instalação usa tecnologia desenvolvida na Alemanha e vai rodar 13 cidades na América Latina. Além de chamar a atenção de futuros moradores, conceito busca atrair novos investimentos para o mercado ambiental.
Parte de contêineres, paredes brancas com vãos livres, vidraças e uma superfície difícil de ser identificada a longa distância. Assim é descrito o objeto exposto em pleno Parque Ibirapuera, em São Paulo.
A construção é, na verdade, um protótipo de casa que convida os transeuntes do parque a conhecer um conceito de moradia que combina energias renováveis e eficiência energética. Batizada como “Casa Alemã”, o espaço foi elaborado com tecnologias desenvolvidas naquele país e traz soluções que poderão ser aplicadas na construção civil brasileira.
Apesar de São Paulo não ser exatamente conhecida por positivos aspectos ambientais – é cortada por dois rios com trechos poluídos e mal cheirosos e concentra um dos trânsitos mais pesados do mundo, o que prejudica a qualidade do ar – a cidade foi escolhida para abrir o roadshow que passará por outras 12 cidades na América Latina.
“Inegavelmente, São Paulo é a maior cidade na América do Sul em termos de avanço tecnológico e preocupação ambiental. Tenho certeza de que São Paulo é a cidade que tem o nível de conscientização mais alto”, justifica Ricardo Ernest Rose, diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Câmara de Comércio Brasil-Alemanha.
A casa ideal
O projeto desenvolvido pela Universidade Técnica de Darmastadt foi vencedor do Solar Decathlon, promovido pelo governo dos Estados Unidos – concurso que reconhece melhores ideias de casas, que só usam o sol como fonte energética. E veio parar na América Latina por iniciativa do ministério alemão da Economia e apoio da Câmara de Comércio Brasil-Alemanha.
Além dos painéis fotovoltaicos – superfície difícil de ser reconhecida de longe, por ser ainda pouco utilizada no Brasil – a casa traz soluções arquitetônicas e técnicas que permitem o uso eficiente e econômico de energia.
Uma das características mais atraentes da construção: ela gera mais energia do que consome e o excesso é armazenado em baterias. O isolamento das paredes e janelas também ajuda a manter a temperatura interna agradável, além de um sistema de ventilação inteligente.
Seria possível?

“Não é uma coisa para você copiar exatamente. O que fica claro é o seguinte: precisamos absorver mais o conceito de utilização dos recursos naturais, de espaços onde se penetre mais ar e mais luz, por exemplo. (…) A fotovoltaica está começando ainda no Brasil, ainda não temos fabricantes, mas deveremos ter em breve”, analisa Ricardo Ernest Rose, lembrando que o Brasil, México e Argentina são os maiores mercados ambientais no continente.
O secretário de Habitação do estado de São Paulo, Lair Alberto Krähenbühl, adianta a novidade: “Tudo o que você vê aqui a gente tem condição de fabricar no Brasil. Fui procurado por dois empresários, que querem arrumar uma área de 50 mil metros para montar uma fábrica de células fotovoltaicas e aquecedores solares. Acho que teremos oportunidade de trazer muita coisa para cá a médio prazo.”
Krähenbühl lembra que algumas iniciativas estaduais já estimulam o uso racional de fontes renováveis, como a instalação de aquecedores solares em casas populares construídas pelo governo.
“Evidentemente você não pode importar uma casa como essa, não compensa. Mas de uma coisa você pode ter certeza: nós seremos eles amanhã”, diz o secretário, que vê com otimismo o Brasil, no futuro, como difusor de tecnologias como as já usadas na Alemanha. (EcoDebate)

domingo, 23 de maio de 2010

Indicadores de sustentabilidade

Esta descrição retrospectiva de um debate científico com quase 40 anos mostra a necessidade de uma trinca de novos indicadores de sustentabilidade capaz de avaliar simultaneamente resiliência ecossistêmica, qualidade de vida e desempenho econômico.
Embora capeiem debates sobre a noção de sustentabilidade em quase todas as áreas do conhecimento, eles obrigatoriamente têm suas raízes nas reflexões de duas disciplinas consideradas científicas: ecologia e economia.
Na primeira, não demorou a surgir oposição à inocente ideia de que a sustentabilidade ecossistêmica corresponderia a um suposto “equilíbrio”. Controvérsia que com ainda mais rapidez desembocou em solução de compromisso, com a ascensão do conceito de resiliência: a capacidade que tem um sistema de enfrentar distúrbios mantendo suas funções e estrutura. Isto é, sua habilidade de absorver choques, a eles se adequar, e mesmo deles tirar benefícios, por adaptação e reorganização. Um ecossistema se sustenta se continuar resiliente, por mais distante que esteja do equilíbrio imaginário.
Foi essa convergência teórica que levou à comparação entre a biocapacidade de um território e as pressões a que são submetidos seus ecossistemas pelo aumento do consumo de energia e matéria por sociedades humanas e suas decorrentes poluições. Comparação que dá base à Pegada Ecológica como indicador de tão fácil compreensão que se torna cada vez mais popular.
Nada parecido ocorreu no âmbito da economia, no qual só pioram as divergências entre três concepções bem diferentes. Para começar, a conhecida colisão entre sustentabilidade “fraca” e “forte”. A primeira é a que toma como condição necessária e suficiente a regrinha de que cada geração legue à seguinte o somatório de três tipos de capital que considera inteiramente intercambiáveis ou intersubstituíveis: o propriamente dito, o natural/ecológico e o humano/social. Na contramão, está a sustentabilidade “forte” que destaca a obrigatoriedade de que pelo menos os serviços do “capital natural” sejam mantidos constantes.
Uma crucial variante dessa segunda corrente rejeita o que em ambas mais há de comum: a ênfase nos estoques. Com o mesmo foco nos fluxos que há meio século viabilizou o surgimento e a padronização do sistema de contabilidade nacional, e que permitiu a mensuração do produto anual de cada país, cuja versão interna (PIB) se tornou o barômetro do desempenho socioeconômico. Suas mazelas foram severamente criticadas, especialmente por só considerar atividades mercantis e ignorar a depreciação de recursos naturais e humanos. O que justamente provocou um processo de busca por correções e extensões com o objetivo de transformá-lo em indicador de “bem-estar econômico sustentável”, depois rebatizado “indicador de progresso genuíno”.
A rigor, é contra todas as anteriores que se ergue a perspectiva biofísica, por negar que a economia seja um sistema autônomo, e entendê-la como subsistema inteiramente dependente da evolução darwiniana e da segunda lei da termodinâmica, sobre a inexorável entropia. Nessa visão, só pode haver sustentabilidade com minimização dos fluxos de energia e matéria que atravessam esse subsistema, e a decorrente necessidade de desvincular avanços sociais qualitativos de infindáveis aumentos quantitativos da produção e do consumo.
Tal algaravia explica a ausência de um indicador econômico de sustentabilidade que desfrute de mínima aceitação. No entanto, a partir da adoção da Agenda 21 na Rio-92, a demanda por esse tipo de indicador havia sido fortemente impulsionada. E em 1996 ela parecia ter achado uma trilha segura com a adoção dos “Princípios de Bellagio” (IISD, 2000). Contudo, os balanços da subsequente proliferação de indicadores reunidos por Lawn (2006) mostraram que os métodos propostos para a avaliação e o monitoramento da sustentabilidade permaneciam elusivos.
Nessas circunstâncias, houve forte propensão a selecionar alguns poucos índices que, juntos, permitissem uma avaliação da sustentabilidade em suas várias dimensões. E a mais interessante proposta desse tipo surgiu nas recomendações de Murray Patterson (2002, 2006) ao governo da Nova Zelândia. Ele advogou que a dimensão econômica fosse medida pelo Indicador de Progresso Genuíno (GPI na sigla em inglês), a dimensão social pelo “New Zealand Deprivation Index”, e a dimensão ambiental por um novo índice composto a ser construído, que cobrisse todos os aspectos do ambiente biofísico e do funcionamento ecológico.
Este artigo chega a uma conclusão diferente, embora confirme a ideia de que a sustentabilidade exige mesmo uma trinca de indicadores, pois ela só poderá ser bem avaliada se houver medidas simultâneas da dimensão ambiental, do desempenho econômico, e da qualidade de vida (ou bem-estar). As principais diferenças estão na necessidade de: a) substituir o PIB por uma medida de renda domiciliar disponível, em vez de se adotar alguma proposta de PIB corrigido ou ajustado, como é o caso do GPI; e b) buscar um indicador sintético de qualidade de vida que incorpore as evidências científicas trazidas por esse novo ramo que é a economia da felicidade.
O recurso utilizado para expor os argumentos que justificam tal conclusão é uma descrição retrospectiva, em quatro etapas, dos quase 40 anos de busca por indicadores de sustentabilidade.
O ancestral comum de 1972
O debate científico sobre indicadores de sustentabilidade foi desencadeado há quase 40 anos por um trabalho que continua amplamente visto como “seminal”. Trata-se do capítulo “Is growth obsolete?”, publicado em 1972 por William D. Nordhaus e James Tobin, no quinto volume da série Economic Research: Retrospect and Prospect, do National Bureau of Economic Research (NBER), dos Estados Unidos.
Como diz o título, o foco não estava propriamente em indicadores, e sim na discussão sobre uma hipotética obsolescência do crescimento econômico. E a argumentação se ancora na teoria econômica canônica para refutar um tipo de contestação do crescimento econômico que crescera nos anos 1960, e que se tornou particularmente aguda nos Estados Unidos entre 1968 e 1972. Ela aparece logo no primeiro parágrafo do texto de Nordhaus & Tobin (1972, p.1) com a seguinte passagem que atribuem ao ecólogo Paul Ehrlich: “Devemos adotar um estilo de vida que tenha como objetivo o máximo de liberdade e felicidade para o indivíduo, não um máximo Produto Nacional Bruto” (PNB).
Mesmo que nenhum outro contestador do crescimento seja citado por Nordhaus & Tobin ao longo das 80 páginas desse trabalho, eles frequentemente usam o plural ao se referirem àqueles que estavam colocando em dúvida que o crescimento futuro pudesse ser desejável e possível (“those who question the desirability and possibility of future growth” [ibidem, p.4]). E é fato que muitos economistas já haviam feito sérias críticas à obsessão pelo crescimento econômico. Por isso, foram eles os verdadeiros alvos de Nordhaus & Tobin, mesmo que a dupla tenha evitado mencioná-los.
Não se pode incluir nesses alvos o famoso relatório ao Clube de Roma intitulado Limits to Growth, pois é do mesmo ano (Meadows et al., 1972). Mas é preciso lembrar que a primeira edição do clássico A sociedade afluente, de John Kenneth Galbraith, havia sido lançada em 1958. Esse livro até pode ter sido ignorado por muitos economistas por considerarem o autor no máximo um bom comentarista político. Nada de parecido poderia ter ocorrido, contudo, com Ezra J. Mishan, ao publicar, em 1967, uma obra-prima sobre os custos do crescimento econômico, traduzida no Brasil com título tragicamente equivocado.
A controvérsia científica sobre o crescimento como dogma certamente foi inaugurada pelo longo e acirrado debate que se seguiu entre Mishan e Wilfred Beckerman. Mas já haviam surgido bem antes os mais incisivos ataques contra aquilo que posteriormente passou a ser chamado de “mania” ou “fetiche” do crescimento. E menos motivados pelos custos apontados por Mishan, do que pelo avanço da consciência sobre seus limites socioambientais. Particularmente nas grandes obras pioneiras publicadas desde os anos 1960 por William Kapp, Nicholas Georgescu-Roegen e Kenneth Boulding.
Para responder a esses verdadeiros alvos ocultos, Nordhaus & Tobin não deixaram de abordar o efeito do aumento populacional sobre o crescimento da produção, assim como a inevitabilidade da perda (waste) de recursos naturais causada por esse crescimento. Todavia, foi a questão da qualidade das medidas usadas para avaliar o crescimento econômico (primeira questão escolhida) que acabou tendo muito mais impacto intelectual, tornando esse trabalho a primeira referência obrigatória de qualquer reflexão sobre indicadores de sustentabilidade.
A pretensão da dupla foi demonstrar que o progresso indicado pelas medidas resultantes da contabilidade nacional convencional (como PNB ou PIB) não é um mito que evapora quando substituído por uma medida que seja de fato orientada para o bem-estar. (“The progress indicated by conventional national accounts is not just a myth that evaporates when a welfare-oriented measure is substituted” (ibidem, p.13)).
Para tanto, introduziram uma série de correções no método de cálculo do produto (nacional ou apenas interno), de maneira a – por um lado – retirar componentes que não contribuem para o bem-estar; e – por outro – acrescentar alguns dos que o fazem, mesmo que não entrem no cálculo convencional por não fazerem parte da produção. Chegaram assim à construção de uma “Medida de Bem-estar Econômico”, ou MEW na sigla em inglês, que é uma medida de consumo em vez de produção.
Evidentemente, o primeiro passo dessas complicadas correções que ocupam as 35 páginas do primeiro apêndice foi se voltar ao produto líquido, em vez do bruto, considerando a absoluta necessidade de depreciações. Logo depois é introduzida a ideia de um nível de consumo per capita que não excede a tendência de aumento da produtividade do trabalho, chamado pelos autores de “sustentável”. Para eles, se o consumo per capita exceder esse nível dito “sustentável”, significa que ele está avançando sobre parte dos frutos do progresso futuro.
Na conclusão, comparam os resultados obtidos para a medida de bem-estar econômico (MEW) aos dados sobre o produto líquido (NNP na sigla em inglês), em vez de compará-los ao PNB (GNP na sigla em inglês), o que teria sido bem mais coerente com o objetivo do trabalho. Se não tivessem usado tal subterfúgio, certamente teriam chegado à conclusão inversa. E o pior é que hoje chega a ser difícil acreditar que a dupla não tenha incluído estimativas de nenhum dano ambiental ou depleção de recursos naturais nos cálculos do que chamaram de “MEW-S”: “Medida de Bem-estar Econômico Sustentável”.
Mesmo assim, nada impede que esse conceito possa ser considerado como o mais remoto ancestral de todos os exercícios posteriores de se corrigir ou ajustar o PNB (ou o PIB) para se chegar a alguma medida agregada de sustentabilidade do desenvolvimento.
A primeira grande virada em 1989
Foi somente dezessete anos depois do seminal capítulo de Nordhaus & Tobin (1972) que surgiu o “Índice de Bem-estar Econômico Sustentável” (Isew na sigla em inglês), graças a uma das mais importantes elaborações do profícuo economista ecológico Herman E. Daly. Nesse caso, incluída em livro que resultou de parceria com o teólogo John B. Cobb Junior: For the Common Good (1989).
A rigor, nesse longo intervalo, houve outras duas contribuições que precisam ser mencionadas por terem sido de muita ajuda para a reflexão crítica de Daly. Por um lado, a pioneira iniciativa do Japão de calcular seu “Bem-estar Nacional Líquido” (NNW, na sigla em inglês), publicado em 1974;5 por outro, uma obra de 1981, que também caiu no esquecimento, de um economista grego já falecido, que em 1989 tornou-se primeiro-ministro: Xenophon Zolotas.
Ao contrário desses precários estudos anteriores, o Isew proposto por Daly & Cobb Junior teve enorme repercussão prática. Foi depois calculado em ao menos onze outros países: Canadá, Alemanha, Reino Unido, Escócia, Áustria, Holanda, Suécia, Chile, Itália, Austrália e Tailândia. E em 2004 se transformou no Indicador de Progresso Genuíno (GPI na sigla em inglês), criado pela ONG americana Redefining Progress (http://www.rprogress.org).
Além de detalhada apresentação dos dois índices (Isew e GPI), o livro Os novos indicadores de riqueza, de Jean Gadrey & Florence Jany-Catrice (2006), exibe três gráficos que ilustram bem os declínios relativos do bem-estar sustentável por habitante entre 1974 e 1990, nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Suécia. Para o caso dos Estados Unidos, cálculos para um período de 40 anos (1950-1990) foram acrescentados na segunda edição do livro For the Common Good, revista e atualizada em 1994. O Isew per capita, que em 1950 era 71% do PNB per capita, caíra para 42% em 1990. Em outras palavras, enquanto o PNB per capita havia aumentado 121%, o Isew só subira 30% (Daly & Cobb Junior, 1994, p. 463).
O grande problema da abordagem Isew, e que piorou no GPI, é que a precificação de danos ambientais, de ganhos de lazer e de trabalho doméstico ou voluntário, por exemplo, continua a ser altamente especulativa, por mais que economistas convencionais e alguns ecológicos se esforcem em aperfeiçoar seus métodos de valoração. Sempre será um exercício arbitrário atribuir grandezas monetárias a prejuízos ou ganhos que não têm preços determinados por mercados. Na falta de alternativa, é claro que um juiz deve preferir que o valor de uma indenização seja calculado por algum desses métodos. Mas coisa muito diferente é pretender que o mesmo será aceito pela sociedade quando se trata de atribuir grandezas monetárias a danos causados por poluições, ao trabalho de pais e mães na criação de seus filhos, ou aos cuidados familiares com os mais idosos.
Além disso, correções do PNB ou do PIB até podem levar a um razoável indicador que chame a atenção para a evolução divergente entre o desempenho de uma economia nacional e o bem-estar ou a qualidade de vida que ela foi capaz de gerar. Mas isso tem muito pouco a ver com a ideia de sustentabilidade, que, por sua vez, se refere necessariamente ao futuro. Mostrar que a taxa de aumento do bem-estar é inferior à taxa de aumento do PNB ou do PIB nada diz a respeito da possibilidade de que essas duas coisas sejam sustentáveis.
Nesse sentido, foi ótima a mudança, em 2004, da denominação do indicador que havia sido criado em 1989 por Daly & Cobb Junior. Ele certamente pode permitir uma avaliação bem razoável do “progresso genuíno” que vem sendo obtido por uma nação, mesmo que tal progresso não possa ser entendido como um aumento “sustentável” de bem-estar.
Em suma, por mais que tenha avançado em relação ao ancestral de 1972, a virada de 1989 não chegou a gerar um indicador que pudesse efetivamente avaliar a sustentabilidade.
Três movimentos paralelos a partir de 1995
O que há de comum nos índices até aqui mencionados é a ideia de partir dos dados das contabilidades nacionais que tradicionalmente visam ao cálculo do produto (seja ele interno ou nacional, bruto ou líquido) para se chegar a algum indicador de bem-estar econômico, ou de progresso genuíno. Mas não de sustentabilidade. Por isso, era de esperar que outros caminhos fossem explorados no esforço de obter indicadores de sustentabilidade.
Tal situação deu origem a três outras abordagens: a) construção de grandes e ecléticas coleções, ou dashboards; b) índices compostos ou sintéticos, com várias dimensões, cujas variáveis costumam ser alguns dos dados pinçados das mencionadas coleções; c) índices focados no grau de subconsumo, subinvestimento ou excessiva pressão sobre recursos.
Um bom panorama da proliferação de indicadores nessas três direções está em Bellen (2005). Ela foi tão intensa que gerou uma espécie de nevoeiro intelectual sobre a mensuração da sustentabilidade (ambiental ou do desenvolvimento), apontada em Veiga (2009a). Mas que três anos antes havia tido um tratamento bem mais detalhado e muito mais profundo na coletânea editada por Philip Lawn (2006). Dela já se podia extrair a constatação de que não havia surgido (e provavelmente nunca surgiria) um indicador que revelasse simultaneamente o grau de sustentabilidade do processo socioeconômico e grau de qualidade de vida que dele decorre. Mesmo que possam ser dois lados da mesma moeda, nada sugere algum método contábil ou estatístico capaz de gerar uma única fórmula sintética em que ambos estejam expressos.
Em consequência, podia-se concluir a partir de uma leitura de Lawn (2006) que a melhor maneira de utilizar tais indicadores na orientação de política deveria requerer necessariamente algum tipo de consórcio. Por exemplo, usar algum dos indicadores de bem-estar em dueto com algum outro mais focado na pressão sobre os recursos. Isso talvez pudesse mostrar se um país estaria se aproximando ou excedendo seu nível macroeconômico ótimo. Ou, ainda mais crucial, a que distância ele estaria de seu ponto máximo de sustentabilidade. A comparação de dois indicadores como esses talvez fosse até capaz de revelar possibilidades de declínio econômico e de catástrofe ecológica.
Essa perspectiva de adoção de dois ou três índices, todavia, só poderia esbarrar na impossibilidade de encontrá-los. Isto é, de escolher indicadores que revelassem alguma coisa de significativo e de forma coerente. Quanto à primeira das abordagens citadas – a das coleções/dashboards -, nem há necessidade de justificativa. Podem ser ótimos como bases de dados, mas são tão heterogêneos que, a rigor, nem poderiam ser entendidos como indicadores. Quem tiver dúvida é instado a consultar o melhor deles, fruto de trabalho tripartite: Unece/OECD/Eurostat (2008).
Por isso, aqui só serão consideradas as outras duas abordagens: índices compostos/sintéticos e índices focados no grau de pressão humana sobre os recursos.
Na primeira categoria, a iniciativa que mais ganhou notoriedade foi a proposta de pesquisadores de Yale e de Columbia (Estes et al., 2005) de construção de um Índice de Sustentabilidade Ambiental (ESI na sigla em inglês) e de um Índice de Desempenho Ambiental (EPI na sigla em inglês). O primeiro contém 76 variáveis que cobrem cinco dimensões. O segundo agrega as mesmas 76 variáveis em 21 indicadores intermediários. Por mais que sejam maneiras razoáveis de reunir um grande número de informações e de servir como convite para que se dê mais atenção a alguns de seus componentes, todos esses tipos de exercício são altamente precários de um ponto de vista estritamente estatístico. Ainda mais quando misturam variáveis de caráter objetivo, como a taxa de mortalidade infantil, com variáveis de tipo subjetivo, como uma nota atribuída à qualidade das agências ambientais de cada país.
Entre os indicadores focados no grau de pressão sobre os recursos, dois bem diferentes adquiriram grande visibilidade: a Poupança Líquida Ajustada (ANS na sigla em inglês) e a famosa Pegada Ecológica (Ecological Footprint).
A ANS, também conhecida como poupança genuína, ou genuíno investimento, é um indicador inteiramente voltado à avaliação de estoques de riqueza, em vez de fluxos de renda, de consumo ou de produção (World Bank, 2006). Sua raiz teórica está na ideia de que a sustentabilidade requer essencialmente a manutenção de um constante estoque de riqueza ampliada (extended wealth). Estoque que agrega recursos naturais, capital físico/produtivo e capital humano. O que supõe, é claro, que entre eles haja integral possibilidade de substituição, ideia das mais controversas. E apesar de todos os esforços apoiados pelo Banco Mundial, essa abordagem esbarra no imenso obstáculo metodológico da precificação de muitos ativos fundamentais, especialmente de recursos naturais estratégicos. Por isso, os resultados não têm sido nem um pouco convincentes ou persuasivos.
O inverso ocorre com a Pegada Ecológica, pois não envolve os malabarismos exigidos pelas abordagens monetárias, além de transmitir uma noção que pode ser facilmente assimilada pelo público preocupado em encontrar bons indicadores de sustentabilidade. Só pretende mostrar quanto da capacidade regenerativa da biosfera está sendo usada em atividades humanas (consumo).
Proposto inicialmente por Wackernagel & Rees (1995), esse indicador tem sido promovido pelo Global Footprint Network, pelo Redefining Progress e também pelo WWF, que publica as atualizações em seu relatório anual Living Planet Report. No entanto, a aparente simplicidade da Pegada Ecológica também esconde sérios problemas técnicos que foram enfatizados em três recentíssimos relatórios: CGDD (2009), Le Clézio (2009) e Stiglitz-Sen-Fitoussi (2009).
Não faltam incoerências na metodologia da pegada. Por exemplo: a biocapacidade de uma área cultivada é aferida pelo rendimento observado, quando deveria ser aferida pelo rendimento que permitiria manter constante a fertilidade desse solo no futuro, isto é, seu rendimento “sustentável”. O mesmo ocorre com a avaliação da biocapacidade das pastagens. Assim, em âmbito nacional, o déficit ecológico dessas terras sempre será equivalente ao déficit comercial do setor. E em nível mundial nunca haverá déficit ou superávit ecológico relativo à agropecuária. Esse foi um dos principais argumentos de Bergh & Verbruggen (1999) para afirmar ser inerente à pegada um viés contrário ao comércio internacional. A inversa biocapacidade de países com altas ou baixas densidades populacionais – como a Holanda e a Finlândia – os leva a trocas comerciais que não podem ser entendidas como indicadores de insustentabilidade, a menos que se pretenda alguma autonomia autarca.
Não é por outro motivo que versões mais recentes da metodologia de cálculo da pegada enfatizam que o superávit ecológico de uma nação não pode ser entendido como critério de sustentabilidade. Mais do que isso, autores da metodologia passaram a insistir que a pegada de cada país seja comparada à biocapacidade global em vez da nacional (Moran et al., 2008). E isso obriga, então, que a pegada ecológica seja entendida como um indicador da contribuição dada à insustentabilidade global, em vez de um indicador de sustentabilidade deste ou daquele país, região ou localidade.
Há deficiências semelhantes nos métodos de cálculos relativos às áreas construídas, às áreas florestais e à pesca. No entanto, mais importante do que criticá-las é chamar a atenção para o fato de que na concepção da pegada acaba existindo uma ponderação subjacente ou intrínseca. Será razoável admitir que a importância relativa das florestas seja de apenas 9% e o da pesca de reles 3%? De resto, por essa concepção admite-se que uma substituição de florestas por terras cultivadas aumentaria a biocapacidade disponível, aliviando, então, o déficit ecológico, o que não faz nenhum sentido.
Por essas e outras razões, o que é preciso reter é a ideia básica de medir as várias pressões humanas sobre os ecossistemas para compará-las à sua capacidade de suporte. Mas sem agregá-las. Ou seja, comparar, por exemplo, emissões de carbono com a área de floresta que seria necessária para absorvê-las.
Finalmente, esta enxuta apresentação dos três movimentos paralelos não poderia deixar de incluir menção ao esforço de construção de contas ambientais acopláveis ao sistema de contabilidade nacional (green accounting). Pois bem, em 2007, a revista Ecological Economics (61) foi consagrada ao Seea-2003 (System of Environmental and Economic Accounts), mostrando que as antigas controvérsias sobre esse projeto tendem a aumentar em vez de diminuir.
A segunda grande virada em setembro de 2009
Não é mais possível falar a sério de indicadores de sustentabilidade sem ter como ponto de partida as mensagens e recomendações que estão no Report by the Commission on the Measurement of Economic Performance and Social Progress (Stiglitz-Sen-Fitoussi, 2009).
A primeira grande contribuição dessa Comissão já foi mostrar com muita clareza que existem três problemas bem diferentes, que não deveriam ter sido misturados nem isolados, como fizeram todos os indicadores ao longo de quase 40 anos. Uma coisa é medir desempenho econômico, outra é medir qualidade de vida (ou bem-estar), e uma terceira é medir a sustentabilidade do desenvolvimento. E para essas três questões o relatório deu orientações muito mais radicais do que supunham quase todos os observadores:
1) O PIB (ou PNB) deve ser inteiramente substituído por uma medida bem precisa de renda domiciliar disponível, e não de produto;
2) A qualidade de vida só pode ser medida por um índice composto bem sofisticado, que incorpore até mesmo as recentes descobertas desse novo ramo que é a economia da felicidade;
3) A sustentabilidade exige um pequeno grupo de indicadores físicos, e não de malabarismos que artificialmente tentam precificar coisas que não são mercadorias.
Em outras palavras, o relatório propõe a superação da contabilidade produtivista, a abertura do leque da qualidade de vida e todo o pragmatismo possível com a sustentabilidade. Como as duas primeiras questões não fazem parte do escopo central deste artigo, o leitor mais interessado poderá consultar o quarto capítulo de Veiga (2009b), que contém um resumo do conjunto do relatório. Contudo, é importante que não se perca de vista que as recomendações sobre a sustentabilidade supõem que o desempenho econômico e a qualidade de vida também sejam medidos por novos indicadores. Indicadores que nada têm a ver com os atuais PIB e IDH.
A Comissão optou por tratar a sustentabilidade de forma muito mais ampla do que costuma sugerir o adjetivo “sustentável” quando aposto a qualquer outro termo. Por exemplo, quando diz que os já difíceis pressupostos e escolhas normativas ficam ainda mais complicados pela existência de “interações entre modelos sócio-econômicos e ambientais seguidos por diferentes países”. Ou quando se refere a um “componente ‘econômico’ da sustentabilidade” relativo ao “sobreconsumo de riqueza”.
É preciso lembrar que, na origem, a ideia expressa pelo adjetivo sustentável se referia à necessidade de que o processo socioeconômico conservasse suas bases naturais ou sua biocapacidade. Foi no progressivo abandono do qualificativo em favor do substantivo que surgiu essa ideia de “componentes” não biofísicos da sustentabilidade. E isso tem várias implicações, especialmente quando a biocapacidade passa a ser entendida como um capital (natural) ao lado de capitais humanos/sociais e físicos/construídos.
Ou seja, em vez de se enfatizar a imprescindível sustentabilidade ambiental do processo que se costuma chamar de desenvolvimento ou de progresso social, passa-se a tratá-la ao lado de várias outras, cuja lista pode ser bem longa, contribuindo para uma séria diluição da ideia original. Um bom exemplo está na já mencionada abordagem tripartite Unece/OECD/Eurostat (2008). Nela os indicadores são separados em dois exclusivos “domínios”: um chamado de “bem-estar de fundo” (foundational well-being) e outro chamado de “bem-estar econômico”. E indicadores normalmente considerados ambientais estão distribuídos por esses dois domínios. No primeiro, surgem desvios de temperatura, concentrações de ozônio e particulados, disponibilidade de água, ou fragmentação dos hábitats naturais, junto com indicadores de educação e de expectativa de vida ajustada pela saúde. No segundo, indicadores de recursos energéticos, minerais, madeireiros e marinhos, junto com indicadores de capitais (produzido, humano e natural) e de investimentos externos. Ou seja, o conjunto de indicadores de desenvolvimento sustentável proposto por esse grupo de trabalho consorcia dois grupos: um socioambiental com seis, e outro econômico-ecológico com oito.
A mais importante orientação do relatório sobre sustentabilidade foi enfatizar que qualquer indicador monetário deve permanecer focado apenas em seus aspectos estritamente econômicos. Não apenas porque grande parte dos elementos que interessam não tem preços definidos por mercados. Também porque mesmo para os tenham, não há nenhuma garantia que os preços revelem a sua importância para o bem-estar futuro.
Ou seja, contrariamente ao que parecia sugerir o rascunho do relatório lançado no início de junho de 2009,7 em seu relatório final a Comissão acabou por tomar distância da abordagem que vem sendo promovida pelo Banco Mundial (ANS: Adjusted Net Savings). A grande concordância é que o conjunto de indicadores que poderá mensurar a sustentabilidade deve informar sobre as variações de estoques que escoram o bem-estar humano. Mas a maior ênfase do relatório final da Comissão está na absoluta necessidade de que os aspectos propriamente ambientais da sustentabilidade sejam acompanhados pelo uso de indicadores físicos bem escolhidos. E é o “princípio da precaução” que a Comissão evoca para justificar essa ênfase, “dado nosso estado de ignorância”.
O recado é claro: buscar bons indicadores não monetários da aproximação de níveis perigosos de danos ambientais, como os que estão associados à mudança climática. É possível deduzir, então, que, se as emissões de carbono das economias viessem a ser bem calculadas, poderiam ser os indicadores das contribuições nacionais à insustentabilidade global. Melhor ainda se surgissem medidas parecidas para o comprometimento dos recursos hídricos e para a erosão de biodiversidade. Talvez bastasse essa trinca para mostrar a que distância se está do caminho da sustentabilidade.
Por último, mas não menos importante, uma definição de sustentabilidade perdida na página 250: “[...] a questão é sobre o que nós deixamos para as futuras gerações e se lhes deixamos suficientes recursos de todos os tipos para que possam desfrutar de oportunidades ao menos equivalentes às que tivemos”.
Em resumo, estas são as mensagens e recomendações do relatório que se referem aos indicadores de sustentabilidade:
Mensagem 1: Medir sustentabilidade difere da prática estatística standard em uma questão fundamental: para que seja adequada, são necessárias projeções e não apenas observações.
Mensagem 2: Medir sustentabilidade também exige necessariamente algumas respostas prévias a questões normativas. Também nesse aspecto há forte diferença com a atividade estatística standard.
Mensagem 3: Medir sustentabilidade também envolve outra dificuldade no contexto internacional. Pois não se trata apenas de avaliar sustentabilidades de cada país em separado. Como o problema é global, sobretudo em sua dimensão ambiental, o que realmente mais interessa é a contribuição que cada país pode estar dando para a insustentabilidade global.
Recomendações: a) a avaliação da sustentabilidade requer um pequeno conjunto bem escolhido de indicadores, bem diferente dos que podem avaliar qualidade de vida e desempenho econômico; b) característica fundamental dos componentes desse conjunto deve ser a possibilidade de interpretá-los como variações de estoques e não de fluxos; c) um índice monetário de sustentabilidade até pode fazer parte, mas deve permanecer exclusivamente focado na dimensão estritamente econômica da sustentabilidade; d) os aspectos ambientais da sustentabilidade exigem acompanhamento específico por indicadores físicos.
Conclusão
Mesmo que não esteja de acordo com as recomendações de Patterson (2002, 2006), a descrição retrospectiva feita neste artigo confirma a linha geral de sua proposta, recentemente fortalecida pelo relatório final da Comissão Stiglitz-Sem-Fitoussi (2009).
A avaliação, a mensuração e o monitoramento da sustentabilidade exigirão necessariamente um trinca de indicadores, pois é estatisticamente impensável fundir em um mesmo índice apenas duas de suas três dimensões. A resiliência dos ecossistemas certamente poderá ser expressa por indicadores não monetários relativos, por exemplo, às emissões de carbono, à biodiversidade e à segurança hídrica. Mas o grau de tal resiliência ecossistêmica não dirá muito sobre a sustentabilidade se não puder ser cotejado a dois outros. Primeiro, o desempenho econômico não poderá continuar a ser avaliado com o velho viés produtivista, e sim por medida da renda familiar disponível. Segundo, será necessária uma medida de qualidade de vida (ou bem-estar) que incorpore as evidências científicas desse novo ramo que é a economia da felicidade. (EcoDebate)

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Brasil poderia economizar cerca de R$ 8 bilhões por ano com reciclagem de todos os resíduos

Brasil poderia economizar cerca de R$ 8 bilhões por ano com reciclagem de todos os resíduos.
De acordo com estudo do Ipea, essa cifra poderá ser alcançada, caso a sociedade brasileira recicle todos os resíduos que são encaminhados aos lixões e aterros sanitários.
Se a sociedade brasileira reciclasse todos os resíduos que são encaminhados aos lixões e aterros, poderíamos economizar cerca de R$ 8 bilhões ao ano. Hoje, a economia gerada com a atividade de reciclagem varia de R$ 1,3 a 3 bilhões anualmente.
Os dados são de um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e foram apresentados hoje (14/5), em Brasília, em reunião com as ministras Izabella Teixeira, do Meio Ambiente, Márcia Lopes, do Desenvolvimento Social, e representantes do Ministério das Cidades e Caixa Econômica Federal.
O levantamento realizou a estimativa dos benefícios econômicos e ambientais da reciclagem. Para se chegar a essa cifra, foram utilizados parâmetros como os custos evitados e os atuais da reciclagem, bem como os custos intrínsecos e econômicos da coleta seletiva.
Outros pontos como a elevação do nível de renda dos catadores, estímulo à profissionalização e elevação da eficiência destes trabalhadores, aumento da coleta de materias específicos e prioritários, grau de organização dos cooperados e incentivo às cooperativas foram elencados no documento como estratégias e objetivos a serem alcançados por meio de uma política de pagamento por serviços ambientais urbanos. O estudo prevê ainda o apoio aos catadores não cooperados.
A ministra Izabella relembrou a possibilidade de aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, em tramitação no Senado Federal, e disse que há um esforço do Executivo para aprovar o projeto de lei (PL) que trata do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Ela ressaltou que a solidez técnica do estudo do Ipea conferiu magnitude à proposta, e que os dados apresentados reforçam a oportunidade de aprovar o PL do PSA , bem como de fazer a emenda aditiva do PSA Urbano, que beneficiará os catadores de materiais recicláveis.
“Saímos do campo da percepção para o trabalho com números concretos, baseados em estudo consistente, que vai nos possibilitar a apresentação de uma proposta sólida ao presidente Lula. Queremos promover uma mudança significativa na cadeia de reciclagem e na atividade profissional dos catadores”, afirmou. Izabella lembrou ainda que a questão dos resíduos sólidos é fundamental para a redução dos gases de efeito estufa, meta prevista no Plano de Mudanças Climáticas.
De acordo com Márcia Lopes, a aprovação do projeto de PSA será uma expressão da ação dos catadores, e vai garantir o reconhecimento desse trabalho e o acesso à cidadania, além de associar o desenvolvimento do meio ambiente ao social.
Já o presidente do Ipea, Márcio Pochmann, disse que o trabalho de reciclagem tem permitido o resgate social de grupos historicamente excluídos, e que, caso aprovado o projeto de lei, o pagamento por serviços ambientais urbanos poderá gerar benefícios e inclusão de cerca de um milhão de brasileiros.
Será criado um Grupo de Trabalho (GT) para discutir as medidas legais e institucionais para a implementação do Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos (PSAU), e ainda outros mecanismos e aperfeiçoamentos para a viabilização da proposta.
Atualmente, apenas 14% da população brasileira conta com o serviço de coleta seletiva, e somente 3% dos resíduos sólidos urbanos gerados nas cidades são coletados nos municípios. (EcoDebate)

Dragagem do Canal do Fundão/RJ ameniza poluição

Poluição é o principal fator de empobrecimento dos pescadores da Baía de Guanabara/RJ. Dragagem do Canal do Fundão ameniza poluição.
O canal separa o continente da Ilha do Fundão, onde fica o câmpus da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A poluição é o principal fator de empobrecimento das comunidades pesqueiras da Baía de Guanabara. Esta é a avaliação do presidente da Federação dos Pescadores do Rio de Janeiro (Feperj), José Maria Pugas. Para ele, o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que poderia reativar a pesca na região, anda em ritmo lento.
“O nosso maior apelo é que as questões ambientais sejam enfrentadas verdadeiramente, e os critérios de licenciamento de empreendimentos industriais sejam mais rígidos. O programa de despoluição da baía ficou parado por 4 meses, só as estações de tratamento de esgotos estão evoluindo, mas não em sua plenitude. As redes de coletas, que ao meu ver são a prioridade, estão sendo construídas e tem melhorado. Mas tudo está longe do ideal”, destacou Pugas.
Pugas também critica a ocupação industrial das áreas ao redor da baía. E é acompanhado pelo ambientalista Sérgio Ricardo, da Organização Não Governamental Verdejar, que denuncia os impactos ambientais que decorrentes dessa ocupação sem planejamento. “De quatro anos para cá, a baía está sofrendo um processo de reindustrialização. Isso gera vários impactos ambientais como as áreas de exclusão de pesca: cada empreendimento ocupa um local que proíbe a pesca a determinada distância. Sobraram apenas 13 áreas pequenas próximas do canal central e da ponte Rio-Niterói, e não está havendo nenhuma compensação ambiental”, afirmou o ambientalista.
Na comunidade da Vila Pinheiro, no Complexo da Maré, zona norte do Rio, existe uma colônia de pescadores embaixo do viaduto da Linha Vermelha, uma das principais vias expressas da cidade. Aproximadamente 40 pescadores circulam cotidianamente na região, entre os canais do Cunha e do Fundão. Dependendo das condições do mar, chegam a pescar, em média, 40 quilos de peixes, que são vendidos na Central de Abastecimento (Ceasa).
“Estamos tendo muitos barcos danificados devido às obras, os canos de dragagem têm obstruído o canal (do Cunha). Antes nós passávamos até com maré vazia. Amanhã eu não sei, a tendência é melhorar, mas hoje não vemos diferença nenhuma”, reclama o pescador Francisco de Assis, da colônia da Vila Pinheiro.
Pedro Machado, também da colônia, elogiou a implantação das barreiras ecológicas, chamadas Eco Barreiras que, além de conter o lixo, geram renda para as cooperativas da região. Mas o pescador pondera que as pessoas precisam ser educadas para não jogar lixo nos rios. “A minha família mora às margens do rio Faria Timbó, em Manguinhos. A última chuva forte no Rio encheu mais de um metro dentro de casa, coisa que as pessoas achavam que não ia mais acontecer por causa da dragagem que fizeram na região há 5 anos. Colocaram essa barreira de contenção, que ajudou muito. Mas ainda falta conscientização, reeducar as comunidades e explicar que não pode jogar lixo nos rios”, disse o pescador.
“O Canal do Cunha é a parte mais poluída da Baía de Guanabara, tanto por esgotos como pela poluição industrial. Recebe esgoto sem tratamento de toda a Zona Norte e da Leopoldina, onde concentram-se grandes favelas, como Maré, Manguinhos, Jacarezinho e Alemão. Além do parque industrial instalado na região, como a refinaria de Manguinhos, que há décadas polui a Baía de Guanabara”, explicou Sérgio Ricardo.
Dragagem do Canal do Fundão ameniza poluição que afeta a Baía de Guanabara
A degradação ambiental do Canal do Fundão é preocupante. O canal está assoreado, o que dificulta a navegação pesqueira. O mau cheio é habitual. O problema começou em 1950, quando a região foi aterrada para a criação da Ilha do Fundão, onde hoje funciona a maioria das instalações da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e do Complexo da Maré, que já foi a maior favela sobre palafitas do Rio e hoje está parcialmente urbanizada.
Desde essa época, o risco de doenças nas comunidades da região é permanente, sobretudo nos afluentes do Canal do Cunha, cujas águas desembocam no Canal do Fundão, antes de chegar à Baía de Guanabara. O acúmulo de materiais contaminados, do lixo sólido e do grande volume de esgoto doméstico e industrial contribuem para aumentar os índices de poluição.
As obras no Canal do Fundão, que iniciaram em maio de 2009, integram o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG). O projeto está sendo executado pela construtora Queiroz Galvão, com financiamento da Petrobras, sob responsabilidade da Secretaria Estadual do Ambiente e da Fundação Bio-Rio. O valor do contrato é de R$ 184 milhões, e visa a recuperação ambiental da região com a reurbanização completa do local.
O subsecretário estadual do Ambiente, Antônio da Hora, destaca que já foram dragados cerca de 400 mil m³ de sedimentos com a retirada de 150 toneladas de resíduos no Canal do Fundão. Uma das dificuldades, segundo o subsecretário, é levar as máquinas para o canal, por causa das pontes e da falta de acessos às margens. Depois de concluído o trabalho de dragagem, da Hora acredita que os benefícios serão sentidos rapidamente pela população local. “Essa região é a foz do Canal do Cunha, que por sua vez é a foz de diversos rios da região. Uma vez que vamos desobstruir a boca de saída deles na Baía de Guanabara, vamos desobstruir o fluxo dos rios e também reduzir a possibilidade de enchentes”, disse.
Instalados em aproximadamente 56.000 m², divididos em duas áreas, os bolsões de desassoreamento do canal irão retirar 200 m³ de material contaminado por mês. Em um dos bolsões, os resíduos retirados do fundo do canal já chegam a 2 metros de altura.
Mas os ambientalistas criticam a dragagem do canal. “Aquilo ali não tem nenhum benefício concreto para as comunidades em volta, não é saneamento básico, não é recuperação de nada, é uma dragagem sem conter o assoreamento. Nós corremos o risco de, daqui a três anos, ter de dragar novamente”, critica o ambientalista Sérgio Ricardo, da Organização Não Governamental Verdejar.
Antônio da Hora contesta o ambientalista. Ele garantiu que a dragagem não é “algo para 5 ou 10 anos”. Barreiras ecológicas foram instaladas para conter o lixo que flutua nos rios e, assim, as águas passariam a circular normalmente. “Nossa expectativa é de que a região passe a ter um assoreamento normal de 1 a 3 cm por ano. A água que não circula terá seu fluxo normalizado, trazendo benefícios para toda a região”, afirmou da Hora.(EcoDebate)

Aquecimento global é pior para os mais pobres

O aquecimento global reflete a desigualdade institucionalizada, pois, atinge diretamente aqueles que possuem os menores recursos à sobrevivê...